…Uma vez que numa Unidade Económica Monetária os países membros partilham a mesma moeda, o endividamento externo deixa de constituir um problema para o país, sendo apenas uma responsabilidade para a família, a empresa ou o banco que assumiu a dívida…
Vitor Constâncio 2000
Na análise das contabilidades dos Estados Americanos, que necessáriamente partilham o dolar, ignoro o papel da Conta Corrente de cada Estado e em que circunstâncias esse cálculo é importante. A Conta Corrente do Alabama é compensada pelas contas correntes dos outros estados dos EUA e dada a mobilidade financeira e laboral entre estados, é provavelmente irrelevante.
Em Portugal, no tempo do escudo, a Beira Alta teria uma conta corrente passível de ser calculada, mas nunca ouvi falar em tal número. Ignoro a sua importância na Contabilidade Nacional.
Partilhando a mesma moeda, parecem os paises membros da UE estar na mesma situação dos estados americanos em relação ao país EUA, mas sem uma unidade fiscal, o que muda tudo radicalmente.
Quando uma indústria dominante fecha as portas num estado pobre do sul dos EUA, milhares são despedidos, e a nível estadual o rendimento per capita desce abruptamente. Como resultado, há uma emigração para outros estados, e Estabilizadores Automáticos entram em acção: subsídios federais do governo central ajudam a pagar a saúde dos desempregados, educação, serviços sociais, segurança pública e mesmo infraestrutura. Novos investimentos privados são encorajados. De modo que em média, cinco anos mais tarde, o rendimento per capita estadual volta aos valores iniciais, quando um novo equilíbrio é restablecido.
Mesmo em condições normais 40 estados são recebedores líquidos de ajuda federal (a ajuda é maior do que os impostos pagos ao governo central).
E para as empresas nos EUA, abrir bancarrota é fácil.
Na Europa a mobilidade laboral é muito mais limitada, e os limites ao deficit impostos pelas regras comunitárias impedem os governos de responderem eficazmente, dum ponto de vista fiscal, a uma situação deflacionária. As nações do sul (Grécia por exemplo) tendem a ficar cada vez mais pobres, os cidadãos terão que emigrar para o norte e o território terá que ser vendido a retalho para pagar as dívidas aos investidores. E quando a unidade fiscal for finalmente instituída….bingo ! O que restava da Grécia, como património dos gregos, sumiu!
O primeiro país a desaparecer absorvido pela grande Nação Europeia.
E os alemães alargarão o Lebensraum (os aeroportos gregos foram comprados por agências para-governamentais alemãs e não por fundos privados internacionais).
Um aparte: os excedentes comerciais da Alemanha são gigantescos, consistentemente maiores do que a China em termos de percentagem do PIB e frequentemente maiores em termos de dólares. Em anos recentes, os excedentes comerciais alemães como percentagem do PIB, têm sido quase o dobro do dos chineses.
E os excedentes comerciais dum país são a contrapartida dos deficits dos outros países.
Duas faces da mesma moeda, um não existe sem o outro.
Mas tudo faz sentido se abandonarmos o conceito de Nação. Sem moeda, própria a Grécia será apenas um estado federado da UE (pessoalmente não percebo a insistência na literatura em mencionar a balança comercial grega, ver acima Vitor Constâncio).
Mas sem uma unidade fiscal! O que estimulará a emigração para a Europa do Norte. E assim, sem capital humano, sem capital imobiliário, sem capital financeiro (nas mãos dos plutocratas gregos em bancos estrangeiros) a Grécia desaparecerá. Pairando no ar, ficarão apenas os nomes dos sítios (Pireu, Tessalónica, etc).
E os recém chegados vindos da Grécia serão bem vindos na Alemanha, que assim não precisará de aceitar tantos refugiados das guerras intermináveis por esse mundo fora.
E quando a grande Nação Europa estabilizar, todos presumivelmente ficaremos melhor… A ver vamos.
Mas nós já cá não estaremos. Porque vai levar o seu tempo.
José Luís Vaz Carneiro
solipso52@aol.com
Tucson, Jan 2023
Notes: Stiglitz The Euro and Rewriting the Rules of European Economy
Fotos de Manuel Rosário