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Galerias Romanas da Rua da Prata

Há anos que andava a pensar visitar as Galerias Romanas de Lisboa, mas como só abrem ao público duas vezes por ano, durante 3 dias, em Março e Setembro e é necessária marcação prévia, quando dava por mim, já tinha deixado passar as datas todas. Até que finalmente ontem, integrada no grupo dos Amigos do Museu do Azulejo, surgiu a oportunidade e lá fui. Não fazia ideia do que me esperava.

O ponto de encontro era às 14h em frente ao nº77 da Rua da Conceição. Éramos 12 e pouco passava da hora marcada, quando a Polícia imobilizou o trânsito naquele troço da rua, incluindo os eléctricos e, perante o olhar atónito dos transeuntes, se abriu no chão uma espécie de “tampa de esgoto” dando acesso a uma escada com degraus estreitos e irregulares escavados na terra por onde descemos até às entranhas da Baixa lisboeta. Uma arqueóloga, calçada de galochas até ao joelho, acompanhou-nos na visita e contou-nos a história do local à medida que nos guiava através de um conjunto de galerias subterrâneas de várias dimensões, de tectos abobadados e paredes irregulares cujos tons castanhos e ocre se reflectiam na água que cobria o chão de terra e onde se podiam ainda observar alguns restos de opus caementicium, também chamado cimento romano. Um dos legados mais importantes da civilização romana está relacionado com as técnicas inovadoras de construção que permitiram a edificação de grandes edifícios, nomeadamente aquedutos, catacumbas, templos, vias de comunicação, etc.

As Galerias Romanas de Lisboa foram descobertas em 1771, após o terramoto de 1755. Inicialmente, por ter sido encontrada uma placa evocativa do Deus Esculápio, tradicionalmente associado à medicina, pôs -se a hipótese desta estrutura subterrânea corresponder a umas termas. No entanto, está hoje estabelecido que se trata de um criptopórtico romano do século I, ou seja, uma estrutura arquitectónica que, numa zona geológicamente instável, de declive e de terrenos arenosos como era o subsolo desta área, permitia melhorar a distribuição das cargas e optimizar o suporte das construções à superfície. Neste caso, seriam muito provavelmente edifícios públicos de grandes dimensões.

Para além da área visitável, sabe-se que estas galerias se prolongam para a zona oriental da cidade, mas não se conhecem ainda os seus limites precisos.

Embora esta estrutura tivesse sido planeada para permanecer seca e estanque, a água acabou por ir entrando através dos lençóis freáticos da zona e, no início do século XX, chegou a ser utilizada como cisterna pela população de Lisboa.  Diz-se até que em determinada altura se criou o mito que estas águas faziam bem aos olhos e muitas pessoas aqui vinham buscar água para curar doenças oculares, o que a mim, que sou oftalmologista, não deixa de me provocar um certo sorriso. Actualmente, as galerias encontram-se permanentemente inundadas com um nível de água superior a um metro de altura, sendo por isso necessário bombear toda a água para permitir as visitas do público, operação que leva cerca de uma semana.

Para além da colaboração de várias instituições (CML, Museu de Lisboa, Centro de Arqueologia de Lisboa, Junta de Freguesia de Santa Maria Maior, etc.), tudo isto implica uma logística complicada que inclui a verificação da segurança da estrutura por parte do Regimento de Sapadores Bombeiros e a intervenção da Polícia Municipal para controlar o trânsito. Compreende-se por isso que só esteja acessível ao público duas vezes por ano.

Para tentar ultrapassar estas condicionantes, está em estudo a abertura de um Centro Interpretativo das Galerias Romanas, que fale não só desta estrutura como dos outros monumentos da Lisboa Romana. Esperemos que esteja para breve.

 

Isabel Almasqué
Setembro, 2022

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As inscrições são feitas neste site do Museu de Lisboa

Fotos de Isabel Almasqué

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Escrito por

Isabel Almasqué, Médica oftalmologista. Ex-Chefe de Serviço de Oftalmologia do Hospital dos Capuchos. Ex-Secretária-geral da Sociedade Portuguesa de Oftalmologia. Co-autora de vários livros sobre azulejaria portuguesa.

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