As manchas das fachadas dos prédios gritam-nos na cara a decadência dum sistema e deixam os nossos olhos percorrer a cor, espreitar o contraste e adivinhar padrões como se de nuvens se tratasse.
Mas na escassez dos meios nasce a criatividade do povo cubano, revelada em soluções artesanais de grades de janelas, contraste de cores, assimetrias intrigantes e sobretudo na vivência dum espaço físico frágil, arrastado dum passado decapitado pelo sonho duma revolução da qual não sobrou dinheiro para manter as casas onde o povo vive.
Ninguém é dono da sua propriedade. O dinheiro não chega para arranjar a casa. Gasta-se na comida.
Quando a família aumenta começa-se por dividir um andar em dois e se o espaço se esgota vemos sinais nas portas de pedidos de trocas de casa.
Entrar em alguns prédios do centro histórico de Havana ainda permite sentir na pele o arrepio da história nas escadarias colossais, estátuas ornamentais decapitadas, imponentes espaços vazios esquecidos da sua função de salões, como velhos com Alzheimer, mas todos eles habitados por uma população de sobreviventes sem memória do espaço onde vivem.
Certamente que os ventos de viragem da história vão chegar a Cuba onde ainda se pode viver em toda a sua dimensão física e imaginária o passado colonial, o excesso do tempo dos casinos e a sobrevivência arrastada da Revolução de Fidel.
Minnie Freudenthal
Março 2011
Música: Harold Lopez-Nussa “Canciones”
Fotos de Ana Henriques, Isabel Almasqué, Manuel Rosário, Minnie Freudenthal e Vanda Oliveira