Não pensámos seriamente nas grandes ameaças à humanidade –
ou deixámo-las indefinidas – pó debaixo do tapete à espera de um cego
Como o cão do cego vemos o pó que não limpámos – dormimos no tapete
com os ácaros, um bronco-espasmo, uma pastilha, uma pandemia – o tufão
do ar em falta, poluído porque escolhemos políticos de opereta, empertigados
Em farpelas pirosas persuadem-nos de que não criarão novas ameaças
Não pensamos nem paz nem pátria ou fé – só a preservação
como neomarxistas neoliberais ou pacifistas um pouco libertinos
a pensar os riscos. Esticamos a corda como se houvesse outro planeta perto
e depois outro e mais outro e lugar para todos no transporte público. Confiar
na história reescrita com os problemas resolvidos e os sobreviventes contentes
depois da glaciação, do tsunami, do impacto do asteroide, da guerra nuclear
que nos deixa com ar idiota, arrependidos e estropiados. A nanotecnologia
reproduzindo armas para continuar a guerra e órgãos-próteses para nos
reabilitarmos e continuarmos a morrer sem acreditar em nada
Nuno Felix da Costa
Março, 2019
Foto do Nuno Felix da Costa