O general acabara de subir
o mais alto degrau
perto das nuvens.
Acima dele, já só
os astros maiores.
Famoso pelos seus feitos,
ousava, destemia,
amava deuses e cavalos de guerra.
Conquistava, alargava os seus domínios,
era dono do mundo.
Leão em toca de fogo
com ira de pedra de lume,
teria granito ou areia no coração?
É pôr-do-sol na Babilónia.
Roxana e Statira, no palácio,
riem cúmplices do pénis torto do general
de meio coração.
Perséfolis, o amigo destruído,
infectado de fraqueza,
jura vingar-se dele
como se necessário fosse
maior castigo, para quem já desconfia
do amigo
como de um parente pobre.
Anoitece.
O céu enche-se de olhos,
mas nenhum olhar aquece o general
que chora seco
o fracasso do sucesso.
Na profundidade de si mesmo,
uma dualidade cria feridas.
Nunca se detivera em ninguém,
em lugar nenhum,
sempre ocupado a chegar a outro sítio.
O general, o Grande, é só.
O homem, de nome Alexandre,
é pequeno.
Os seus cavalos envelheceram
é essa a lei.
Todos os animais envelhecem
mas só alguns humanos conseguem crescer.
Ao senhor do mais rico Império,
só lhe restava crescer, crescer até florir.
Invejou a água do rio que segue o seu curso
sem competir com outros rios,
sonhou construir uma ponte
com um sorriso,
tentou adivinhar
quanto pesa um coração.
Do alto da sua frágil fortaleza,
em vez de território,
avista pela primeira vez a Humanidade
carente de humanidade.
E parece entender que a Idade do Ouro afinal
era a idade em que o ouro não reinava.
Ana Zanatti
Setembro, 2022
Foto de Manuel Rosário
Manuela Carona | 2022-09-19
|
A idade de ouro…a idade em que o ouro não reinava…Gostei muito. Abraç
VL | 2022-10-07
|
Belo e grandioso poema! Como uma síntese filosófica põe a nu a verdade sobre a condição humana; gigante no poder, mas frágil no seu ser mais profundo e existencial!