Já vos aconteceu, querer calar o Mundo?
O grunhir do exaustor a agitar a consciência à superfície da sesta desejada, numa tarde quente, sem pressa.
No aeroporto, seguir os sinais de silent room para afinal partilhar a calma com os que rezam ou como eu, procuram fugir ao ruído.
E naquela manhã que se queria introspetiva, mas em que a motorista da Uber, talvez a querer comprar a minha simpatia, foi contando a história duma cliente que, chegada ao seu destino, lhe pedira para esperar só um bocadinho e depois voltara com uma caixa de bombons Ferrero-Rocher, 5 estrelas de rating e uma boa gorjeta; ou ainda, como recusara a corrida a uma cliente mal-educada. E nós, aos poucos, vamos desistindo da nossa introspeção, tentando sorrir e juntarmo-nos ao grupo dos clientes simpáticos.
Quantas vezes abrimos mão desse silêncio e acabamos por ficar, sempre, um pouco mais cansados?
A mim já me aconteceu só sentir esse silêncio ao mergulhar no azul da água do mar. Cortar todos os fios que me ligavam ao mundo.
E o pior é quando, afinal, o que queremos é preencher o silêncio! E só nos sentimos aconchegados com música a tocar ou se ligarmos a TV… (isso não faço porque não tenho televisão).
E na corrida para casa, no desejo do espaço íntimo, onde nos despojamos das pegajosas emoções do dia, que tantas vezes transportamos de um palco para outro, sem nos darmos conta?
Já repararam naquele canto sossegado num jardim? Ou no espaço abrangente duma catedral vazia?
Quem sabe, têm tudo isto dentro de vocês!
Não se esqueçam de parar, nem que seja por segundos, para deixar o silêncio expandir o tempo e vestirem-se de emoções propícias à vossa intencionalidade.
Minnie Freudenthal
Janeiro, 2020
Fotos de Manuel Rosário
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Isabel Tavares | 2020-02-02
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Gostei do texto. Beijinhos
M A Q | 2020-02-03
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Como sempre acontece com os textos, quer em prosa quer em verso, da Minnie, são oferendas de inteligência, de beleza e de sabedoria.
São – sempre – textos que fazem bem, tanto pelo prazer intelectual , como pelo prazer estético, como pelo abraço que dão a quem os lê.
Obrigada querida Minnie.