PORTUGAL – ROTAS DE ELÉCTRICOS
em évora as cegonhas também trazem bebés
quando voam ainda de bicos a abanar
tocam em pedaços de céu com furtivas garras
modelando o rosto do bebé que há-de vir
usando os pedaços das caveiras
…
só no céu
a norte
no porto
se um pingo desse vinho se entorna,
geme baixinho pelo ar, ferido,
e ao cair
escurece
como uma maçã mordida
…
existe há duzentos anos em lisboa
o ‘hospital das bonecas’
um hospital de briquedos
onde tratam
daqueles que estão partidos dos que já não conseguem chorar
dos que já não têm rodas dos que têm o coração despedaçado
de nós
aqueles que pelo menos uma vez na vida
lamberam grades de metal em dias de gelo
…
na rua das matemáticas em coimbra
casas estão numeradas em deliberada desordem
quando deus lá vai
para matar alguém, como é hábito,
fica confuso
vira a cabeça da esquerda para a direita da esquerda para a direita
como um espectador num jogo de ténis entre o bem e o mal
quando o resultado está quase a chegar ao empate
Tradução de Ana Hudson, a partir da versão inglesa de Ainsley Morse, Maio 2021
Foto de Manuel Rosário
ÁFRICA EM TRÊS REFEIÇÕES
pequeno-almoço
aqui quando chove
chove por muito tempo
assim como
uma transfusão de sangue translúcido
almoço
a maioria dos insectos esquisitos
deste mundo (que não são nada deste mundo)
parecem ter sido concebidos
durante um coito magnificamente interrompido
jantar
o deus branco aborrece-se em África
e quando tem visitas
esconde-se
atrás da porta
entretem-se
a fingir que é criança
e diz com uma
vózinha
‘Não posso abrir a porta,
os meus pais não estão em casa’
a cada janela …
a cada janela
a sua tarde
de acordo com
o tamanho dos vidros
***
abram a janela!
através dela
vão cair na sala
estrelas
e fatias quadradas
de ar
fresco fresco…
Yvette Centeno | 2021-05-09
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Dear Andrei, I see you are slowly coming to us, in Portugal. I wish you and your family all the best.. Keep writing your poetry