De A a Z, tudo se pode fazer DE OUTRA MANEIRA...
 

Poemas de Andrei Sen-Senkov

PORTUGAL – ROTAS DE ELÉCTRICOS

em évora as cegonhas também trazem bebés

quando voam ainda de bicos a abanar
tocam em pedaços de céu com furtivas garras

modelando o rosto do bebé que há-de vir
usando os pedaços das caveiras

só no céu
a norte
no porto
se um pingo desse vinho se entorna,
geme baixinho pelo ar, ferido,
e ao cair
escurece
como uma maçã mordida

existe há duzentos anos em lisboa
o ‘hospital das bonecas’
um hospital de briquedos
onde tratam
daqueles que estão partidos dos que já não conseguem chorar
dos que já não têm rodas dos que têm o coração despedaçado

de nós

aqueles que pelo menos uma vez na vida
lamberam grades de metal em dias de gelo

na rua das matemáticas em coimbra
casas estão numeradas em deliberada desordem

quando deus lá vai
para matar alguém, como é hábito,
fica confuso
vira a cabeça da esquerda para a direita da esquerda para a direita
como um espectador num jogo de ténis entre o bem e o mal
quando o resultado está quase a chegar ao empate

Tradução de Ana Hudson, a partir da versão inglesa de Ainsley Morse, Maio 2021

Foto de Manuel Rosário

ÁFRICA EM TRÊS REFEIÇÕES

pequeno-almoço

aqui quando chove
chove por muito tempo

assim como
uma transfusão de sangue translúcido

almoço

a maioria dos insectos esquisitos
deste mundo (que não são nada deste mundo)
parecem ter sido concebidos
durante um coito magnificamente interrompido

jantar

o deus branco aborrece-se em África
e quando tem visitas
esconde-se
atrás da porta
entretem-se
a fingir que é criança
e diz com uma
vózinha
‘Não posso abrir a porta,
os meus pais não estão em casa’

a cada janela …

a cada janela
a sua tarde

de acordo com
o tamanho dos vidros
***
abram a janela!
através dela
vão cair na sala
estrelas
e fatias quadradas
de ar
fresco fresco…

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Escrito por

É tradutora e mora em Inglaterra há mais de 30 anos. É responsável pelo site ‘Poems from the Portuguese’, que publica poesia portuguesa do século XXI traduzida para inglês.

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  • Dear Andrei, I see you are slowly coming to us, in Portugal. I wish you and your family all the best.. Keep writing your poetry