Balada para o João Cutileiro
Foi então ele que partiu
na longa noite de fado,
noite de consagração
comentei para a menina
a verde, que está sempre
ao pé de mim.
E tinha de ser agora?
Fico ainda mais sozinha?
Não sei quem abriu a porta…
eu tenho estado de guarda
e mais uma vez alguém foi
e partiu sem dizer nada…
com ele já se foram muitos,
mas eu dele não esperava.
Foi chamamento de estrela
foi rasgão na sua pedra
que não deixou que se abrisse,
já nada estava escondido
no segredo desses veios
o coração não batia
e ele não tinha receios
olhava a morte de frente
como Dom Sebastião
menino imberbe roubado
aos mares da inquietude,
aquele desejo de ser
que a ele também consumia…
Disse eu à Menina Verde:
não me explicas onde estavas,
se estavas onde eu pedia…
eu que já peço tão pouco
apenas a companhia…
E disse então a menina:
sei que se foram embora
foram uns atrás dos outros
pela noite fugidia…
A vida estava cumprida,
nada mais fazia falta,
pedra a pedra trabalhada
seu peito todo riscado
mãos feridas de escolher
a pedra que lhe faltava
Pedra numa pedreira
que não dizia onde estava.
Yvette Centeno
in memoriam, Lisboa Janeiro, 2021
Fotos de Yvette Centeno
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