Há 25 anos coordenei uma equipe de 6 pessoas que fizeram um levantamento relacionado com o património azulejar, para a Câmara Municipal de Lisboa. Como o trabalho era remunerado, foi necessário fazer um contrato de prestação de serviços com a Câmara. Nesse sentido, em data e hora determinadas, a totalidade do grupo apresentou-se no gabinete da advogada da CML que, ao ver entrar 6 pessoas, levantou o olhar por cima dos óculos e com ar enfastiado, exclamou: “Então isto agora é tudo à manada?”
Há 10 anos, por ocasião do falecimento de um tio meu, assisti, como é costume, à missa de corpo presente. Grande parte da assistência era composta pela minha família paterna que tem gente de várias origens, nacionalidades e religiões, pelo que, tal como eu, a maior parte de nós se mantinha, respeitosamente, em silêncio. O padre, já na casa dos sessenta ou setenta, lá ia dizendo a missa com voz monocórdica, com maior ou menor participação dos presentes e tudo parecia decorrer tranquilamente, com a monotonia habitual destas ocasiões. De repente levanta a cabeça, fita-me nos olhos e dispara: “Então, nem Amen, caramba!”
Há 2 dias fui notificada para me apresentar no tribunal como testemunha de um caso de falsificação de um cheque. Apenas tinha entrado na sala de audiências, ouvi logo uma voz feminina, cuja origem não detectei, mas pensei ser de uma funcionária (o tribunal era composto exclusivamente por mulheres), dizer-me num tom autoritário: “É para ficar em pé, aí, em frente a essa cadeira.” Pousei no chão a mala e os papeis que levava comigo e, de pé, cruzei os braços, de frente para a Juíza, aguardando as eventuais perguntas sobre o caso. Mas ouvi a mesma voz seca e ríspida: “Descruze os braços!” A expressão da face não deixava dúvidas, estava ali para demonstrar e exercer toda a sua autoridade. Afinal a voz era mesmo da própria Juíza.
Portugal é assim hoje como era há 25 anos. Não vejo razão para que seja diferente daqui a 40. A única diferença é que eu já cá não estarei para aturar gente desta.
Quando as elites não prestam quem se lixa é o povão.
Isabel Almasqué
Abril, 2015
Foto de Isabel Almasqué
Isabel Márquez RS | 2017-11-21
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Não pode ser mais verdade, infelizmente. No outro dia rocei ligeiramente uma roda do carro num passeio quando circulava a 20 km/h numa rua de Cascais. Não queria acreditar quando vi um polícia literalmente aos gritos e a gesticular contra mim. Devem pensar que é assim que se impõe a autoridade… veio-me logo ao espírito a conduta dos congéneres na Suíça onde vivi alguns anos. Mandam parar, passam as multas, tudo numa voz serena e baixa ” Bonjour Madame…il faut faire attention…merci Madame…”.
Isabel almasqué | 2017-11-29
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Pois, é uma questão de cultura e civilidade. Quando os alicerces não prestam, a fachada pode enganar, mas em geral, a estrutura é sempre fraca.
Yvette Centeno | 2022-01-09
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Esta é a gentinha a que estamos entregues, e com a educação como está, não vejo que possa mudar tão cedo. Que país…
Manuela Carona | 2022-01-10
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A elite fanfarrona e oca! Gostei muito…